domingo, 22 de setembro de 2013

O domínio do fato em questão

Gandra, um conservador:
Não há prova contra Dirceu

Do Conversa Afiada
Gandra estragou o domingo do filho do Roberto Marinho (dono da tevê aqui referida) e do Gilmar, que ia ler a Veja


Yves Gandra Martins é um herói do conservadorismo brasileiro.

Em materia religiosa – é um católico militante – está, hoje, à direita do Papa.

Em matéria política, tornou-se um dos entrevistados/especialistas/colonistas (*) do PiG (**).

Não foge a uma opinião que confirme e ilumine as teses pigais.

Como advogado – respeitado, admirado – jamais desafiou a Suprema Corte.

A quem tratava com devoção só comparável à de Sergio Bermudes.

Portanto, essa entrevista – que a Folha não chamou na primeira página, embora lhe tenha oferecido uma página inteira – terá um efeito devastador sobre a comunidade jurídica.

E sobre o Supremo.

Especialmente sobre Gilmar Mentes (***) segundo a abalizada opinião de Ataulfo Merval de Paiva (****).

Gandra azedou o domingo de Gilmar.

Interrompeu, provavelmente, a leitura religiosa que faz do detrito de maré baixa.

Gilmar terá um domingo infernal.

Leia, depois “Por que Gandra atacou o Supremo ?

A entrevista:

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/130274-dirceu-foi-condenado-sem-provas-diz-ives-gandra.shtml


(…)

Do ponto de vista jurídico, eu não aceito a teoria do domínio do fato.

Por quê?

Com ela, eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela –e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do “in dubio pro reo” [a dúvida favorece o réu].

Houve uma mudança nesse julgamento?

O domínio do fato é novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás, pela teoria do domínio do fato, o maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.

O domínio do fato e o “in dubio pro reo” são excludentes?

Não há possibilidade de convivência. Se eu tiver a prova material do crime, eu não preciso da teoria do domínio do fato [para condenar].

(…)

E no caso do mensalão?

Eu li todo o processo sobre o José Dirceu, ele me mandou. Nós nos conhecemos desde os tempos em que debatíamos no programa do Ferreira Netto na TV [na década de 1980]. Eu me dou bem com o Zé, apesar de termos divergido sempre e muito. Não há provas contra ele. Nos embargos infringentes, o Dirceu dificilmente vai ser condenado pelo crime de quadrilha.

O “in dubio pro reo” não serviu historicamente para justificar a impunidade?


Facilita a impunidade se você não conseguir provar, indiscutivelmente. O Ministério Público e a polícia têm que ter solidez na acusação. É mais difícil. Mas eles têm instrumentos para isso. Agora, num regime democrático, evita muitas injustiças diante do poder. A Constituição assegura a ampla defesa –ampla é adjetivo de uma densidade impressionante. Todos pensam que o processo penal é a defesa da sociedade. Não. Ele objetiva fundamentalmente a defesa do acusado.

O ministro Marco Aurélio [Mello] deu a entender, no voto dele [contra os embargos infringentes], que houve essa pressão. Mas o próprio Marco Aurélio nunca deu atenção à mídia. O [ministro] Gilmar Mendes nunca deu atenção à mídia, sempre votou como quis. Eles estão preocupados, na verdade, com a reação da sociedade. Nesse caso se discute pela primeira vez no Brasil, em profundidade, se os políticos desonestos devem ou não ser punidos. O fato de ter juntado 40 réus e se transformado num caso político tornou o julgamento paradigmático: vamos ou não entrar em uma nova era? E o Supremo sentiu o peso da decisão. Tudo isso influenciou para a adoção da teoria do domínio do fato.

(…)

Algum ministro pode ter votado pressionado?

Normalmente, eles não deveriam. Eu não saberia dizer. Teria que perguntar a cada um. É possível. Eu diria que indiscutivelmente, graças à televisão, o Supremo foi colocado numa posição de muitas vezes representar tudo o que a sociedade quer ou o que ela não quer. Eles estão na verdade é na berlinda. A televisão põe o Supremo na berlinda.

(…)

Como o senhor vê a atuação do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso?

Ele ficou exatamente no direito e foi sacrificado por isso na população. Mas foi mantendo a postura, com tranquilidade e integridade. Na comunidade jurídica, continua bem visto, como um homem com a coragem de ter enfrentado tudo sozinho.

O STF virou um legislador ativo. Pelo artigo 49, inciso 11, da Constituição, Congresso pode anular decisões do Supremo. E, se houver um conflito entre os poderes, o Congresso pode chamar as Forças Armadas. É um risco que tem que ser evitado. Pela tradição, num julgamento como o do mensalão, eles julgariam em função do “in dubio pro reo”. Pode ser que reflua e que o Supremo volte a ser como era antigamente. É possível que, para outros [julgamentos], voltem a adotar a teoria do “in dubio pro reo”.

(…)

Por que o senhor acha isso?

Porque a teoria do domínio do fato traz insegurança para todo mundo.



Não deixe ler também a destemida entrevista de João Paulo Cunha, no Estadão:

http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,ja-estamos-todos-condenados-diz-joao-paulo-cunha,1077322,0.htm

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