Se penso, logo existo?
O movimento que foi as ruas, da forma como foi as
ruas, pode ao final ser tanto vitorioso como derrotado. Pois não tendo uma direção não manteve seus
objetivos em discussão na sociedade para acumular outras forças, e portanto, poderá
parir um ”nada de mudanças”.
Estabelecer mudanças sólidas no sistema político
brasileiro exige perseverança e um necessário conhecimento da história recente
do país. Por quê isso? Porque os atores não mudam da noite para o
dia. As forças políticas advindas dos
partidos(visíveis) e dos interesses econômicos(não visíveis) interagem ora em
conflito, ora em arranjos que parecem uma orquestra bem afinada.
Um exemplo é o atual retrato do Congresso Nacional, sua composição é a mais absurda
representação da realidade externa. Vale
refletir: será que temos nos enganado e
votado em nossos algozes?
A democracia é a melhor fórmula para evoluirmos
coletivamente em nossas relações sociais e políticas. Mas mesmo tendo nas mãos a oportunidade de
votar e escolher, parte significativa
das pessoas dão pouca importância às eleições e votam sem avaliar mais
detalhadamente a história dos candidatos.
Sabemos que não é fácil com tanto efeito de Marketing eleitoral, mas é da
vida, ou deciframos o enigma ou somos devorados por ele...
Talvez essa postura seja fruto de uma cultura “coronelista”
que ainda domina os nossos sentidos, fazendo com que a nossa vontade se
manifeste da forma contrária aos nossos reais interesses. Minha observação é que o passado realmente determina
muitas coisas, como a média do pensamento político comum em determinado momento
da história. Façamos um parêntese para
entender isso: “ Muitos são os “ismos” da política nacional.
De forma direta ou indireta, estes influenciaram no desenvolvimento de um
espaço político nacional, ora abortando seu nascimento, ora dando a ele um
caráter mais privado do que público, propriamente dito. Coronelismo,
mandonismo, patriarcalismo, personalismo, clientelismo e até mesmo populismo são
alguns dos “ismos” que se fizeram presentes na história da organização política
do país, servindo às elites como
mecanismos de cooptação, coerção, e de legitimação de seu poder, isto é, como
instrumento para seu acesso e manutenção do comando do Estado.
Foram em grande medida responsáveis pela deformação que o espaço político
brasileiro sofreria em virtude não somente da alteração dos moldes democráticos
do direito de escolha (do voto), mas também pela ausência de ideologias que
visassem o bem público. Representaram a manipulação do eleitorado, tornando o
povo “massa de manobra” através do cerceamento e condução da opinião. Condução esta dada através do alargamento e
perpetuação dos meios de dependência econômica de uma classe excluída social e
politicamente, a qual ao mesmo tempo abdicava da participação ativa da
política.”(Paulo Ribeiro)
De qualquer
forma, o desleixo com o debate franco e honesto, patrocinado pelo pelotão de
choque do conservadorismo dominante no Congresso Nacional, reduziu drasticamente
até aqui, a possibilidade de uma Reforma Política. Aliás, foi um escrachado desrespeito às
manifestações populares que aconteceram no país. Mais que isso, é a manutenção do “sistema”
existente a qualquer custo, para preservar o status quo de quem domina realmente a cena política e os interesses
econômicos, parceiros siameses de uma velha fórmula da política
nacional(internacional?).
Cabe ressaltar a bem da verdade, que os Deputados que
não querem mudanças estão inseridos em todos os partidos, em maior ou menor
número. E isso se espalha em todas as
instituições importantes, como o Judiciário, Ministério público, organizações
da sociedade civil e na linha editorial dos grandes meios de comunicação do
centro do país.
Mas o partido dos Trabalhadores, bem antes dos
manifestos havia iniciado uma campanha nacional para coleta de assinaturas por
uma ampla reforma no sistema eleitoral, projeto de iniciativa popular,
aproveitando legislação existente que garante a apreciação de projetos
subscritos por mais de 1,36 milhão de eleitores. O projeto prevê financiamento
público e voto em lista.
Já a OAB, embora pouco divulgada ou pouco conhecida,
também tem uma proposta bastante interessante. Principalmente porque propõe
eleição proporcional em dois momentos, uma em que se vota no partido e a outra
no candidato depois de definido as vagas de cada partido. Os partidos só poderiam oferecer o dobro de
nomes referente ao número de vagas que teriam obtido na primeira votação. Propõe o financiamento público de campanha e contribuição
de pessoa física. As duas tem a
coerência de deixar de fora a contribuição de empresas.
Os anos que antecederam 1988, foram de debate e
efervescência para definir um novo patamar de direitos e deveres na
constituição do país. Havia objetivamente
mais certezas e convicções a serem debatidas.
E agora? O desejo de mudanças a
pouco manifestado nas ruas é pra valer?
“Não existe testemunha tão terrível,
nem acusador tão implacável quanto a
consciência que mora
no coração de cada homem."( Políbio)
Vilson Roberto
Ex-Prefeito de Cruz Alta – 2005/2008 e 2009/2012.