As manifestações de rua e uso oportunista da Copa
Autor:
Luis Nassif Um balanço das manifestações de ontem por todo o Brasil revela o seguinte quadro desconexo:
1. Nas cidades do interior, o movimento foi contra as câmaras municipais. Em muitas cidades, os manifestantes se dirigiram ou à prefeitura ou às Câmaras com listas de reivindicações.2. Nas capitais, contra prefeitura, governo do estado e assembleias.
3. Na multidão, toda sorte de manifestos, a favor dos direitos dos gays e contra Feliciano, mas também a favor da familia tradicional, contra a PEC 37, contra os estádios na Copa do Mundo etc.
Momentos de catarse, no entanto, favorecem as manifestações oportunistas, de grupos radicais ou de criminosos mesmo. Com 100 mil pessoas em uma passeata. 99.500 podem ter propósitos pacíficos. Mas meia dúzia pode provocar conflitos, eventos e ganhar mais visibilidade que a maioria. Especialmente se souber manobrar alguns sentimentos, informações ou desinformações comuns à multidão.
É por aí que agem os provocadores.
Por exemplo, havia um sentimento difuso contra o uso das manifestações por partidos políticos. Ontem, na Paulista, grupos organizados aproveitaram para potencializar esse sentimento e partir para a agressão. O sentimento era real. A agressão foi ação articulada de grupos neofascistas.
Em outros casos – Prefeitura de São Paulo, Teatro Municipal, Palácio do Itamaraty -, ação nítida de vândalos e criminosos.
Foi visível a montagem do rapaz que saiu belo e lampeiro, amparado pelos amigos, com uma inundação de sangue na cabeça. Uma armação totalmente inverossímil mas que ganhou espaço nas TVs.
O jogo oportunista
No caldeirão geral de insatisfação, existem os oportunistas querendo tirar sua lasquinha. E se posicionam de acordo com interesses específicos.
Nesses tempos de informação e desinformação difusa, há duas bandeiras genéricas que estão sendo empunhadas contra o governo: a corrupção e as obras da Copa.
Os estádios tornaram-se o novo alvo da oposição, pelo fato de ser fácil passar para o cidadão a (falsa) ideia de que os recursos para a construção dos estádios foram subtraídos da saúde e da educação. Cada vez que alguém tiver problemas de atendimento no posto de saúde, imediatamente atribuirá aos gastos com a Copa e, automaticamente, aos governos Lula e Dilma.
É a nova palavra de ordem. Aliás, tão eficiente que há setores no governo atribuindo essa movimentação à Siemens Internacional – por ter bancado integralmente o projeto Jogos Limpos, que o respeitado Instituto Ethos montou para acompanhamento da Copa.
Cada problema mínimo nos estádios passou a ser supervalorizado pela mídia. Cada obra entregue no prazo, minimizada.
Por exemplo, dia desses um comentarista esportivo dizia que não haverá povo nos novos estádios devido ao preço dos ingressos mais caros nas chamadas áreas nobres. Dizia isso comentando um jogo no Pacaembu, no qual havia ingressos mais caros sendo vendidos na faixa de 400 reais.
Os manifestantes nem se dão conta que todas as obras estão sendo acompanhadas por um Grupo de Trabalho do Ministério Público Federal, o próprio MPF que está sendo defendido em várias manifestações, Tribunais de Contas, CGUs etc.
E não se dão contas porque não foram informados. Não há informações disponíveis, para serem usadas pelos que quiserem defender a Copa.
Em nenhum momento o governo montou uma estratégia de comunicação para explicar todos esses aspectos – a razão dos reajustes na construção dos estádios, a existência de sistemas de acompanhamento das obras, as obras que estão sendo entregues no prazo, os ganhos do país com os jogos.
Deixou o tema de bandeja para a oposição.
Os interesses objetivos na mídia
Na mídia, quem está empunhando esta bandeira?
A Globo vive a esquizofrenia entre turbinar qualquer bandeira anti-governo e, ao mesmo tempo, ser a principal beneficiaria dos jogos da Copa – na condição de emissora que adquiriu os direitos de transmissão e de aliada eterna de João Havelange, Riacrdo Teixeira e da FIFA.
No jogo da Seleção, a Globo fixou-se em vários momentos em UMA família com cartazes contra a "roubalheira" da Copa. Depois, mancou-se.
Hoje de manhã, assisti os jornais da Globo e da Record. Na Globo, nenhuma manifestação contra as obras da Copa, contra partidos políticos, nenhum espaço maior para as manipulações políticas das passeatas nem para os cartazes anti-corrupção. Os apresentadores estavam empenhados em classificar as manifestações como pacíficas e os quebra-quebras como restritos a grupos pequenos de vândalos.
Ontem, de fato, o Jornal Nacional foi especial, acompanhando os problemas em Brasília. Pode-se defender alegando interesse jornalístico.
Na Record – adversaria da Globo – há ênfase permanente na denúncia dos estádios da Copa, na corrupção, no tamanho dos impostos, nas concessões à FIFA.
Para rebater a defesa da Copa, pelo jogador Ronaldo, a Record passou um vídeo de um pai com a filha tetraplégica, devido a um erro médico, acusando as obras da Copa como responsáveis pela tragédia. A cada momento, a crítica (justa) aos privilégios da FIFA, aos estádios, à carga de impostos, à situação da saúde, da educação.
Quem é a conspiradora?
Provavelmente, nenhuma. Apenas cada qual aproveitando o caldeirão de insatisfação para seus interesses comerciais imediatos. A Globo é beneficiária da Copa; a Record, não.
Próximos passos
As ruas já deram seu recado, já expuseram a insatisfação geral do país com tudo.
Agora, é hora de parar para não abrir espaço para oportunistas e marginais.
O próximo passo dos grupos e governantes de boa vontade será abrir canais de diálogo e participação.
À medida que os novos tempos forem sendo construídos, aparecerão os efeitos positivos das manifestações e serão diluídas as manobras oportunistas e golpistas.
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